Aprender a aceitar o sofrimento é uma atitude derrotista ou libertadora?

Você já parou para observar a sua mente quando está com raiva? Normalmente, no momento em que estamos em uma discussão, sendo cobrados por algo que não devemos ou mesmo em uma simples “fechada” no trânsito, temos aquele sentimento de “não ver mais nada”. Agir no calor do momento tem inúmeras consequências e geralmente elas não são positivas.

Mas será que é possível acabar com esse sentimento tão negativo ou quem sabe, amenizá-lo? De uma perspectiva budista, a resposta é: sim. Mas, antes que você pense que precisará virar um monge e meditar isoladamente por anos em lugar distante para isso, saiba que domar a raiva pode ser até mais fácil do que você imagina. Contudo, há uma condição: que você consiga observar a sua mente.

Imagine que você está morrendo de dor de cabeça e descobre que alguém na sua casa tomou o último analgésico da caixa de remédios, o que você faz? Sente dor, indignação, revolta por não ter passado na farmácia e raiva, muita raiva daquela situação toda. 

Antes de gritar com alguém, se indignar, sentir ainda mais desconforto, por que não respirar fundo e ligar para uma farmácia que faça entregas ou abrir um dos muitos aplicativos de delivery e solicitar o que você precisa?

Você fez tudo isso e finalmente chegou a medicação. Por mais moderna que seja a medicina atual, ainda leva um tempo para que ela faça seu efeito. O que fazer até lá? Ficar remoendo a dor, sentir angústia, entrar em desespero? Aliás, alguma vez essas atitudes trouxeram algo de bom e positivo? Acredito que não. 

Para os budistas, o principal oponente para combater a raiva –  e os muitos sofrimentos que advém dela – se chama Aceitação Paciente. Até que a dor passe, aceite o sofrimento.

“Péra aí”, você deve estar pensando, “então eu devo simplesmente aceitar a dor?”

No começo é um tanto desafiador, mas a resposta é um sonoro “sim”. Não existe um ditado popular que diz “o que não pode ser solucionado, solucionado está”? 

Shantideva, um importante mestre budista, escreveu em seu “Guia do Estilo de Vida do Bodhisattva”:

“Se algo pode ser remediado, 

Por que me infelicitar a esse respeito?

E se não houver remédio,

Continua não havendo razão para a infelicidade”

Se você parar para analisar os momentos mais felizes da sua vida, verá que, de certa forma, o sofrimento acompanhou todos eles. Conseguiu comprar a casa dos sonhos? E a burocracia da documentação ou de uma possível reforma? Finalmente fez a viagem internacional que sempre sonhou e teve as bagagens extraviadas? Trocou de carro e alguém quebrou o retrovisor novinho?

As nossas alegrias são limitadas, é impossível ser feliz o tempo inteiro e quanto mais cedo “aceitarmos” isso, mais fácil será lidar com os desafios do cotidiano, sejam eles do tamanho que forem. 

Da próxima vez que você se pegar preso no trânsito, perceba que socar o volantes, bufar, e xingar os céus não farão com que os carros andem mais rápido. Por que então não pensar algo como “espero que não tenha acontecido um acidente grave, espero que todos estejam bem”. 

Ou que tal colocar uma música que você gosta? Sincronizar naquele podcast que ensina um outro idioma enquanto fica “parada”? Caso seja budista ou simpatizante, recitar mantras pode ser uma boa opção. 

A prática da aceitação paciente proporciona que você tenha controle das suas emoções. Comece com algo “pe queno” e então aumente para situações mais cabeludas, como quando seu chefe começar a gritar com a sua equipe no escritório a troco de nada. Pense “eu aceito o que está acontecendo agora” e quando os ânimos se acalmarem, você toma uma decisão mais assertiva, caso seja possível.

No livro “Como Solucionar Nossos Problemas Humanos”, Venerável Geshe Kelsang Gyatso, escreve o seguinte: 

“A maioria dos nossos problemas emocionais surge devido à nossa incapacidade de aceitar as coisas como elas são. Na realidade, mais do que tentar mudar o mundo exterior, a solução está em reagir com aceitação paciente. Por exemplo, muitos dos nossos problemas de relacionamento surgem porque não aceitamos nosso parceiro como ele é. Porém, a solução não é transformá-lo naquilo que gostaríamos que fosse, mas aceitá-lo plenamente. ”Lembre-se, não podemos evitar a ocorrência de situações desagradáveis, por mais rico e afortunado que você seja, elas vão acontecer. Já pensou como irá lidar com isso? Caso queira se aprofundar nesse assunto, aqui você encontra o livro que inspirou esse texto. Ele é curtinho, apesar de profundo, dá até para ler na temida sala de espera do seu dentista!

Taísa Szabatura

Taísa é jornalista com passagem em diversas publicações como Revista Veja, Isto é e Portal G1. É praticante Kadampa há 05 anos e aplica esforço sincero para colocar os ensinamentos em prática na sua vida cotidiana.
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