O que aprendi sobre budismo vendo um filme de terror

Sempre tive medo de filmes de terror, a lembrança de Freddy Krueger me atormentou durante anos, tinha pesadelos e não conseguia dormir. Num domingo desses, no entanto, aceitei o convite para assistir a um filme com meu filho e uns amigos. Aliás, uma das coisas mais legais de ser mãe é justamente essa: a possibilidade de ampliar o mundo do seu filho e vice-versa. Era um filme sobre demônios antigos e já comecei assustada. Até que, num dado momento, percebi que meu filho estava achando engraçado e meus amigos pareciam entediados. Enquanto tentava assistir cobrindo parcialmente os olhos umas cenas mais violentas me lembrei dos ensinamentos sobre vacuidade.

Geshe Kelsang Gyatso, em seu livro Budismo Moderno, nos explica o que é vacuidade:

Vacuidade é o modo como as coisas realmente são. É o modo como as coisas existem, que é oposto ao modo como elas aparecem. Acreditamos, naturalmente, que as coisas que vemos ao nosso redor – como mesas, cadeiras e casas – são verdadeiramente existentes porque acreditamos que elas existem exatamente do modo como aparecem. No entanto, o modo como as coisas aparecem aos nossos sentidos é enganoso e completamente contraditório ao modo como elas realmente existem. As coisas aparecem como existindo do seu próprio lado, sem dependerem da nossa mente“.

Mas, Cecília, o que isso tem a ver com um filme de terror? Cada um de nós, naquele momento, experienciava o filme de maneira única  e particular. Como dizer então qual a experiência real e verdadeira? Susto, tédio, graça, indiferença? Tudo depende de nossa mente, que observa e interage com todos os fenômenos. E isso pode ser libertador.

Saímos do filme e perguntei para meu amigo por que em nenhum momento ele ficou assustado. “Claro que não tive medo, pois não era real”. Ponto para ele.

Buda nos ensina que tudo é como um sonho, e entender isso é poder olhar para as situações que nos afligem e perceber que são transitórias.Entender que o que aparece para nós é da natureza da nossa mente nos permite lidar com nossos problemas e sofrimentos de maneira mais serena e pacífica.

Pode parecer estranho no início, mas para mim é a grande sacada do budismo: “mude sua mente, mude seu mundo”. As mudanças começam dentro de nós.

Portanto, da próxima vez que você estiver num filme de terror (e eles acontecem dentro e fora das telas) lembre-se disso: tudo é como um sonho. Vai passar. As coisas não são da forma que percebo. Os seres sagrados estão por aqui e posso contar com eles nesse pesadelo. Respire fundo. The end.

Referência: Geshe Kelsang Gyatso. Budismo Moderno: o caminho de compaixão e sabedoria. 3a. edição. Editora Tharpa Brasil, 2013. (Disponível para download gratuito)

Cecília Attux
Cecília é praticante Kadampa e procura aplicar os ensinamentos budistas na sua rotina. Como médica psiquiatra buscou no budismo novas maneiras de entender a mente, mas encontrou além disso um caminho de compaixão e sabedoria que deu um novo sentido à sua vida.

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